Olhando para as estrelas

Olhando para as estrelas

A gente precisa ler, assistir, vivenciar coisas, situações que ampliem nossas cabeças.
Nossa cabeça precisa ser ampliada, nosso contexto precisa ser estendido.
Percebo que, mesmo no mundo de hoje, 20 anos de um novo milênio, muitas cabeças não se ampliaram.
Muitas pessoas recusam a se abrirem e, estagnaram em convicções e premissas mortas, obsoletas. Engessaram e como se dizia na década de 70, ficaram com a “cabeça ruim”. Dessa forma, o retrocesso e a ignorância se instalam.
A “cabeça ruim” prejudica o planeta.
Muitos “vivem” com a “cabeça ruim”, macerando crenças equivocadas, limitantes, retrógradas, não alinhadas com a evolução que a vida jorra. A vida, essa viva e inédita, é evolutiva; vida e evolução se mesclam, dançam…
Assisti a um filme brasileiro, um documentário no Canal Arte 1
(as pessoas deveriam, também, usar esse canal pago como um dos meios de ampliação de contexto; a arte é ampliadora, amplificadora).
No filme\doc.; ( “Olhando para as estrelas”) duas bailarinas cegas fazem parte da única escola de ballet para cegos do mundo. Geyza é a primeira bailarina da cia. e professora de ballet, que está se preparando para se casar; e Thalia, uma de suas alunas adolescentes, que está lidando com todas as mudanças de sua idade. Suas histórias vão além do desafio de dançar sem uma referência visual, e elas querem ser boas profissionais, sendo parceiras e amigas que trabalham com garra para tornarem-se melhores.
Geysa. cega , adulta, ministrando aulas de ballet clássico para alunas , também cegas, na barra, usando o toque, a música, a vontade de dançar é impressionante, impactante, emocionante, ampliador, amplificador….
Crianças ( meninos e meninas) bem pequenas e cegas tendo, com muito carinho, aulas de ballet clássico com professores cegos e não cegos e o acolhimento que reina, esgarçaram alguns paradigmas que insistiam em ocupar minha cabeça.
Durante anos; 15 anos, fui terapeuta e professor de consciência corporal, dança livre, soltura e desbloqueio corporal como um todo. Fui muito bem treinado por um professor argentino que “resolveu” aterrissar nessas paragens brasileiras e me ensinou muito e depois associei meus conhecimentos de psicólogo gestaltista, reichiano, técnicas de teatro e fui somando, sempre aprendendo e somando para mim e para os meus alunos e alunas; sempre mais alunas que alunos, pois os homens são ainda limitados e na década de 70, 80, 90, anos 2000 ainda o são; até quando não sei; mas cresceram pouco, ampliaram muito pouco. Já escrevi sobre essa evolução da mulher bem superior a do homem em outro texto.
O filme\doc. me reportou à uma vivência que tive em 1987. Nessa época, eu trabalhava em BH, Salvador, Rio com cursos de formação nessa área de consciência corporal para psicólogos, médicos, bailarinos profissionais, fisioterapeutas,, etc
Eu me relacionava (ainda me relaciono) com pessoas da área da dança e uma das minhas amigas, uma das pioneiras em BH, ainda atuante aos 81 anos, resolveu trazer a BH, uma bailarina argentina, aos quase 98 anos hoje, a excepcional Maria Fux. Nessa época Maria tinha por volta de 68 anos.
Maria Fux, uma mulher que teve toda uma formação em ballet clássico, teatro, Pedagogia e que, durante sua vida seus caminhos a levaram a desenvolver uma didática de ensino da dança para surdos\mudos, cegos, pessoas com deficiências diversas. Minha amiga que a trouxe me chamou para ajudar a recebê-la, desde o aeroporto até no seu local de hospedagem, nas suites do Hospital do Prof Dr. Hilton Rocha ( nessa época vivo e esfuziante). Para mim era muito rico conviver com uma mulher como Maria Fux, um homem como Dr. Hilton Rocha; pessoas que deixaram marcas no planeta. O curso estava divulgado para as pessoas indicadas em escolas especializadas, profissionais da área, professores de dança da área infantil, etc
Na palestra onde Maria Fux apresentou sua pedagogia da dança, eu fui o tradutor do espanhol portenho dela para o português mineiro, com o auditório do Instituto Hilton Rocha lotado no alto das Mangabeiras. Ela, nessa palestra que apresentava o curso que aconteceria três dias depois, fez as pessoas, mesmo assentadas dançarem com os braços, inclusive o inesquecível Dr. Hilton Rocha.
No curso, na enorme sala da academia da minha amiga (dos maiores salões de dança de BH, ainda) estavam presentes crianças não muito pequenas, adolescentes, adultos, homens e mulheres e eu, mesmo traduzindo, resolvi participar “de cabeça” de uma aula de dança para pessoas com alguma deficiência…
Era incrível, aquela mulher com 68 anos, linda, intensa, inteira, “pegando” pessoas surdas e ensinado-as a abraçar as enormes caixas de som espalhadas pelo salão e pedindo que sentissem a vibração que vinha da música e transformasse essa vibração sentida num movimento, “ponga en su cuerpo esa vibracion sentida”, tradutores de libras ajudavam, ela ajudava muito, pois tinha um jeito tão especial de lidar com alunos especiais.
Cegos, nas aulas dela tinham uma visão do movimento, da música em seus corpos. Na dança clássica e nas maioria das danças o espelho tem uma função forte. Dual, ao meu ver. O espelho ajuda muito para ver-nos , para fazer eco ao movimento expresso. Mas estimula o narcisismo, vicia o ver-se e o estar certo, o movimento correto, que, de fato em dança livre e da alma não existe esse certo e errado. E os cegos , sem espelho, me inspiraram muito sobre dançar sem essa fixação. Dançar…
Assistindo ao filme\doc. “Olhando para as estrelas” , me dei conta, mais uma vez, que precisamos nos afastar, sem nos alienar, desse apequenamento sociopolítico que recebemos pelas diversas mídias que acessamos. Que possamos acessar coisas, situações, arte; informações ampliadores, amplificadoras.
Existem muitas situações que reforçam a “cabeça ruim” que grassa no mundo, entre nós; PORÉM existem (busque, fuce, fareje) situações, coisas, vivências que nos agiganta, nos coloca bem perto do tamanho da VIDA.

Sobre Hercoles Jaci

Psicólogo desde 1980...Professor e psicoterapeuta...
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Uma resposta para Olhando para as estrelas

  1. Moni Parlangelo disse:

    Olá Hercoles, adorei a reflexão, vou buscar o filme para assistir. Abraços.

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