A difícil arte de entregar-se

Entrega/desapego- A difícil arte de entregar-se quando toda a aprendizagem aconteceu num caminho inverso-florais

No andar da vida vamos aprendendo coisas e tendo que dar, muitas vezes, respostas antagônicas à essa aprendizagem. Para não enlouquecer precisamos de um dispositivo interno- um biodigestor poderoso- do contraditório , do paradoxal…Muitos autores que estudam pessoas que são expostas à situações contraditórias afirmam que isso afeta profundamente a saúde mental delas. Somos todos sobreviventes: eu sou, você que me lê é!!!ChrysanthemumO mundo, a família, os amigos, os mais chegados ou não, dizem- porque também assim ouviram- que devemos ficar mais ativos, cabreiros, com os pés bem atrás, ser trouxa nunca, ser esperto sempre, sem maldade jamais. Quando você se torna um bom aluno dessa escola: Não vem de garfo que hoje é dia de sopa; você recebe o diploma de ADULTO, crescido, maduro, vivido. Então, para alguns, pode acontecer de que a própria vida nos leve para outros caminhos, de outros mundos, de outros valores, de outras propostas, com uma orquestração totalmente voltada para a eternidade, para a essência espiritual, para um DES- envolvimento. Aí vem a entrega/desapego. DES- aprender é muito mais difícil do que aprender.

Uma vida de descoberta interna, uma rota de busca interior profunda requer entrega/desapego. Uma simples massagem requer entrega, soltar os músculos. Um abraço precisa disso…Uma sessão de terapia sem entrega se torna conversa fiada. O trabalho de des-construção é muito árduo. Por isso, para entrar profundamente no trabalho de descoberta do si mesmo mais profundo é necessário a desconstrução (com carinho e delicadeza, com orientação de preferência). Essa des-construção nos dá uma sensação interna de morte, pois o que foi construído o foi por sobrevivência e deu trabalho, colocamos energia nisso. E a dor advinda é ainda o apego, o pé atrás. Uma das benesses que a vida nos colocou para nos ajudar nesses momentos, além de outras, é a terapia com florais. Me vem duas essências californianas: Chrysanthemun e Angel’s Trumpet que vão estar alinhadas com essa proposta da entrega, do des-apego.

Não existe um método pronto para entregar, para desapegar…A própria onda inédita da vida, única, eterna, carregada de continuidade sem travamento nos conduz a esse estado ou não…Essas essências ajudam muito quando tomadas um bom tempo, num contexto de um trabalho intencionado para isso. A entrega é necessária no amor, na arte, no trabalho, no contato contigo mesmo, com a natureza…E o desapego, como dizem os adolescentes de hoje, é saber que a fila anda, que a vida é dinâmica e ela tem um rítmo, apesar dela respeitar profundamente o nosso, mesmo estando muitas vezes desvinculados do dela, que é mais recomendável…Nessa nova proposta não precisamos ser bobos, nem imbecis, porém também não precisamos ficar de tocaia, des-confiando da nossa luz, da nossa origem, do nosso destino…Para ilustrar essa reflexão, ofereço um pequeno conto russo, que extraí do livro: Histórias para acordar da Diléa Frate…Sugiro ir desarmando, baixando a guarda, respirando leve e profundo, lendo o conto com um fundo musical lindo onde Mercedes Sosa canta: Volver a sentir profundo como un niño frente a Dios.

Era uma vez uma floquinha de neve que vivia no alto de uma montanha gelada. Um dia, apaixonou-se perdidamente pelo sol. E passou a flertar descaradamente com ele. -Cuidado!!!, alertaram os flocos mais experientes: Você pode derreter. Mas a floquinha não queria nem saber e continuava a olhar para o sol, que com seus raios a queimava de amor. Ela nem percebia o quanto se derretia…Ficou ali ainda um bom tempo, só se derretendo, se derretendo. Quando viu, era uma gotinha, uma pequena lágrima de amor descendo, com nobreza e delicadeza, a montanha. Lá embaixo, um rio esperava por ela.

Sobre Hercoles Jaci

Psicólogo desde 1980...Professor e psicoterapeuta...
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12 respostas para A difícil arte de entregar-se

  1. Professor Hercoles,
    Adoro seus textos, sempre maravilhosos e com muita sabedoria.
    Sou grata
    Claudia Malavasi- São Paulo

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  2. Muito obrigada pelo escrito. Você tem um dom e esse aparece quando fala da alma humana e sua trajetória…Nossa. Muito bom!-Sandra Moreira-Rio de Janeiro-RJ.

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  3. Eliana M. Nogueira Camargos disse:

    Hércoles, essa foi mesmo direto na minha alma, porque estou justamente vivendo este processo de des-construção. Não por escolha, mas pela perda do amor da minha vida. Mais de trinta anos de relacionamento… Esse foi o ritmo que a vida/morte determinou, embora com certeza não fosse o meu, muito menos o que eu quisesse. Estou fazendo o doutorado em saudade e solidão, Mas decidi que vou sobreviver (e olha que levei um tempo para decidir isto)! Hoje comparo-me à Fênix, e ainda estou queimando. Sinto que tenho que queimar até o fim, des-construir tudo, para apenas depois iniciar a re-construção. Só que aí bem mais sábia, mais madura (mas sin perder la ternura jamás), devido às lições que estou aprendendo agora. Volver a los 17… mas com tudo que foi vivido, sentido e aprendido durante tanto tempo. Uma linda Fênix há de surgir das minhas cinzas. Amém!
    Gostei muito da estória da floquinha, que se derrete toda por amor!
    Obrigada. Beijos.-Eliana Camargos-Belo Horizonte-MG.

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    • Angela Maria de Mello Almeida disse:

      Querido amigo! Que emoção senti e quanto des-envolvimento. Agradeço,,crescendo através dos textos, que realmente conversam com a alma. Beijos. Angela de Mello.Belo Horizonte-MG.

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  4. Glaucia Prosdocimi disse:

    Oi Hércoles, o texto está “enxuto”, gostoso, ótimo de ler. O início me lembrou Carl Rogers quando ele fala de “incongruencia”. Carinho prá vocè; de sua amiga “arisca”, Glaucia Prosdocimi-Brasília-DF.

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  5. Cátia Mucida disse:

    Olá Hercoles!
    Gosto muito dos seus textos. Parabéns!
    Grande abraço!

    Cátia Mucida-Belo Horizonte–MG.

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  6. Solange disse:

    Gostei muito; ler teus textos é um aprendizado,abraço .Solange-Goiânia-Go.

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  7. Vera O´Neill disse:

    Difícil, mas necessário, des-apegar, a dor é intensa, pois estamos impregnados dos ‘aprendizados’ familiar, escolar, religioso, filosófico, sem mencionar os aprendizados da vida, aqueles que vamos incorporando, ao longo do caminho, como verdades e fazendo deles, também nossas referencias, quantos apegos. Mas como disse vc Hércoles, difícil desapegar quando todo aprendizado aconteceu no caminho inverso/florais. Sem a prática do desapego, não existe a possibilidade de continuarmos a construir a estrada de nossas vidas, pois a busca requer leveza e literalmente pouca bagagem. Nesta jornada da vida, sempre haverá, em toda etapa de nossas vidas, algo que teremos que deixar para trás (pessoas, matéria, crenças e muitas outras coisas). Mas, como somos criaturas de hábitos, iremos sempre resistir, pois ‘aprendemos’ que tudo que conquistamos é de nossa propriedade, ai, já está instalado o apego, por isto digo que é difícil, mas necessário, inclusive a pratica da desconstrução de hábitos. Seus textos têm sido uma bênção para mim, pois estou no momento mais árduo de minha vida, ou seja, deixar a vida que eu conhecia para trás e seguir pelos caminhos do totalmente desconhecido (deixar o medo Mimulus para encarar o medo Aspen).
    Um grande abraço e agradecida de coração.Vera O’Neill- Portmouth-England

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  8. Graça Cruz disse:

    Para des-construir é preciso ter a coragem de vir a ser uma pessoa adulta, inteira, feliz!
    Pode parecer um paradoxo, e talvez o seja, mas….esse vir a ser amedronta muito a nós mesmos e às pessoas que nos rodeiam! Abraços-Graça Cruz-Belo Horizonte-MG.

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  9. Maria Elizabeth V.Mesquita Caetano disse:

    Seu texto chegou no momento certo para mim..Sempre muito apegada as minhas duas filhas, me vejo agora com a terrível sindrome do ninho vazio.Concentrei todo o meu amor, meu afeto, minha energia nas duas.Vivemos momentos intensos e maravilhosos.Agora, cada uma seguindo seu caminho e eu aqui, com o coração partido , desnorteada e perdida.Preciso desapegar,entender que nossos filhos não são propriedade nossa e que devem partir para construir a vida que desejam.Sinto que esta faltando um pedaço de mim.Mas estou pronta a vencer essa etapa difícil e recomeçar um novo ciclo.Muito obrigada,Beth Mesquita-Belo Horizonte-MG

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  10. Délcio de Almeida disse:

    Estou tomando “florais” há exatamente 1 mes….coincidências ???existe ou já existia movimentos de mudanças???mais:lucidez…estou, “vendo”, “sentindo,”percebendo”,nas entrelinhas,o que está atrás das palavras,atos, atitudes,acusações.. puxa ! parece que o auto conhecimento, conhecer nossos “jogos”,como manipulamos,como acusamos,como chantageamos….e de repente…. me deparo enxergando no outro este tipo de atitude, antes passaria despercebido,e,ficaria com culpa,por baixo,me sentiria o último dos homens,mas atento me defendo e mostro o jogo ,a acusação injusta,e,saio ileso,sem culpas e sem remorso do que fui acusado.
    Assusta!!! dá medo!!! se conhecer,conhecer o que era desconhecido,suas mazelas,seus vicios,”defeitos” de fabricação ou “defeitos” que foram sendo aprendidos e anexados à sua personalidade para se defender da “humanidade”dos “concorrentes”mas a vontade é de rebelar contra esta “corrente do mal”,de se liberar,ser você mesmo,não importando com o que os outros pensam,como se é julgado e criticado por seus atos,neste momento o que importa é você consigo mesmo… é sua redenção…parece loucura…parece egoísmo…apaixonar por voce mesmo..ou pelo sol…deixar ele te conduzir ao rio e este ao oceano;é o desconhecido,é a entrega consciente,é sair do lugar comum,quebra de conceitos, de paradigmas,mas com fé, amor e determinação,podemos arrepender???errar??? SIM !!!! mas e a consciência de que deveriamos “rebelar” “agir” e o medo nos fez paralisar…ficar cristalizados,acomodados,acorvadados!!! não será pior conviver com esta situação??? Que Deus nos abençoe e nos proteja!!!Délcio Almeida-Contagem-MG.

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  11. Olá Hércoles,
    Me fez bem ler este texto.
    Estou num momento de urgência por mudanças, buscando me liberar dos excessos de bagagem, do que não me serve ou convém mais… Coisas, padrões de pensamentos, emoções, relacionamentos…
    É um desafio descondicionar, desapegar e descobrir que podemos escolher responder a cada momento ao que a vida nos traz ao invés de reagir a partir de referências antigas e que já não cabem mais.
    abraço,
    Jomélia- Bahia-Ba.

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